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quarta-feira, 7 de setembro de 2011

A Serpente


Nos arredores de uma pequena aldeia na Índia, vivia uma serpente negra. Sua picada não era fatal, mas deixava um homem doente por várias semanas. E muitos da aldeia já tinham sido mordidos. A serpente era rápida e maligna. Ela atormentava a aldeia.

Aconteceu numa primavera, de um homem sábio que fazia sua peregrinação anual, passar pela aldeia. Seus habitantes, adultos e crianças apressaram-se em correr e aglomerar-se ao seu redor para pedir suas bençãos. Um camponês, ao contrário, postou-se fora da multidão, e aguardou até que o sábio colocasse sua mão na última cabeça, e foi então que se aproximou e disse:

- Venerável sábio, eu não venho pedir uma benção para mim apenas, mas para toda a aldeia. Se você puder nos livrar da serpente que nos atormenta , então seremos verdadeiramente abençoados, não só em palavras mas em ação.

O homem sábio pediu então que o conduzissem ao local onde havia um buraco no qual a serpente vivia. Ao se aproximar, o homem sábio viu a serpente toda enrolada em espiral, deitada próxima ao buraco. 

O sol iluminando seu corpo macio e gordo, fazia brilhar faixas verdes e amarelas que compunham seu couro negro.

- 'Serpente' – murmurou o homem sábio. Eu vim conversar com você. 

A serpente ergueu sua cabeça e encarou o homem sábio com seus olhos vidrados.

- 'Serpente' – sussurrou o homem. 'Você tem que se desviar desse mau caminho por onde você tem deslizado'. ' A vida é curta. Quem saberá quantas outras tantas vidas você terá que viver para reparar esta?'

E começou a acariciar suavemente as costas da serpente. A serpente abaixou a cabeça e fechou seus olhos. E o homem sábio continuou a falar baixinho:

- 'Serpente, você deve trilhar um caminho de paz, viver em harmonia com todos os seres vivos'

Nessa hora a serpente silvou longa e nefastamente. Mas o homem sábio persistiu, sussurrando e acariciando suas costas. Devagarinho a serpente foi se desenrolando. E começou a se balançar suavemente como que acompanhando o ritmo dos sons suaves do homem sábio. Ele por sua vez escolhia cuidadosamente suas palavras, até cativar totalmente a serpente. Anoiteceu e o sábio ainda estava ali a falar e a acariciar a serpente mansamente. Finalmente ele disse:

- 'Serpente, eu preciso ir agora. Mas vamos fazer um pacto. Por um ano inteiro você não fará mal aos habitantes da aldeia. Ao findar um ano eu voltarei e conversaremos novamente'

A serpente concordou e aceitou a promessa. Um ano se passou e novamente o homem sábio parou na frente do buraco da serpente e chamou:

- 'Serpente, serpente, eu estou aqui'. O homem sábio esperou por algum tempo até que viu a serpente sair com muito esforço e devagarinho.

Ele viu também muita dor e sofrimento. Seu corpo antes macio e lustroso, agora definhava, opaco e magro. Sua pele estava coberta com enormes cicatrizes e feridas algumas ainda em chagas.

- 'Serpente, querida serpente'.Gritou e chorou o homem sábio. 'Quem fez isso com você?'

Falando baixo mas sem amargura, a serpente contou sua história. 

Quando os camponeses souberam da sua transformação, eles começaram por sua vez a atormentá-la. De longe, primeiro atiravam pedras e paus. Depois, vendo que ela não reagia, chegaram mais perto então.

- 'Eu cumpri minha promessa' – disse a serpente. 'E o resultado é que não posso mais dormir ao sol sem ser beliscada, pisoteada ou chutada. Eu errei em ouví-lo. Você é o responsável pelo meu sofrimento'

O homem sábio acariciou suavemente a fina pele da serpente.

- 'Ah pobre serpente, eu sou realmente culpado. Seu tormento é inteiramente minha falha, pois eu não soube me expressar adequadamente. Eu pedi que você parasse de atacar os camponeses, mas não que parasse de silvar para eles'

Tradução livre a partir de 'Stories from an Eastern Coffee House'
by Elizabeth Retivov, Doric Pub Co. ,1963 – The snake and the wise man.


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